Na sua forma peculiar de escrever, mordaz, inteligente e séria, Mário Crespo, mais uma vez, coloca o dedo na ferida, e diz-nos como vai este nosso cantinho à beira-mar plantado.
Nesta fase nada no mundo me faria revelar o nome de quem relatou este episódio. É oportuno divulgá-lo agora porque o parlamento abriu as comportas do dinheiro vivo para o financiamento dos partidos. O que vou descrever foi-me contado na primeira pessoa. Passou-se na década de oitenta. Estando a haver grande dificuldade na aprovação de um projecto, foi sugerido a uma empresária que um donativo partidário resolveria a situação. O que a surpreendeu foi a frontalidade da proposta e o montante pedido. Ela tinha tentado mover influências entre os seus conhecimentos para desbloquear uma tramitação emperrada num labirinto burocrático e foi-lhe dito sem rodeios que se desse um donativo de cem mil Contos "ao partido" o projecto seria aprovado. O proponente desta troca de favores tinha enorme influência na vida nacional. Seguiu-se uma fase de regateio que durou alguns dias. Sem avançar nenhuma contraproposta, a empresária disse que por esse dinheiro o projecto deixaria de ser rentável e ela seria forçada a desistir. Aí o montante exigido começou a baixar muito rapidamente. Chegou aos quinze mil Contos, com uma irritada referência de que era "pegar ou largar". Para apressar as coisas e numa manifestação de poder, nas últimas fases da negociação o político facilitador surpreendeu novamente a empresária trazendo consigo aos encontros um colega de partido, pessoa muito conhecida e bem colocada no aparelho do Estado. Este segundo elemento mostrou estar a par de tudo. Acertado o preço foram dadas à empresária instruções muito específicas. O donativo para o partido seria feito em dinheiro vivo com os quinze mil Contos em notas de mil Escudos divididos em três lotes de cinco mil. Tudo numa pasta. A entrega foi feita dentro do carro da empresária. Um dos políticos estava sentado no banco do passageiro, o outro no banco de trás. O da frente recebeu a pasta, abriu-a, tirou um dos maços de cinco mil Contos e passou-a para trás dizendo que cinco mil seriam para cada um deles e cinco mil seriam entregues ao partido. O projecto foi aprovado nessa semana. Cumpria-se a velha tradição de extorsão que se tornou norma em Portugal e que nesses idos de oitenta abrangia todo o aparelho de Estado.
Rui Mateus no seu livro, Memórias de um PS desconhecido (D. Quixote 1996), descreve extensivamente os mecanismos de financiamento partidário, incluindo o uso de contas em off shore (por exemplo na Compagnie Financière Espírito Santo da Suíça - pags. 276, 277) para onde eram remetidas avultadas entregas em dinheiro vivo. Estamos portanto face a uma cultura de impunidade que se entranhou na nossa vida pública e que o aparelho político não está interessado em extirpar. Pelo contrario. Sub-repticiamente, no meio do Freeport e do BPN, sem debate parlamentar, através de um mero entendimento à porta fechada entre representantes de todos os partidos, o país político deu cobertura legal a estes dinheiros vivos elevados a quantitativos sem precedentes. Face ao clamor público e à coragem do voto contra de António José Seguro do PS, o bloco central de interesses afirma-se agora disposto a rever a legislação que aprovou. É tarde. Com esta lei do financiamento partidário, o parlamento, todo, leiloou o que restava de ética num convite aberto à troca de favores por dinheiro. Em fase pré eleitoral e com falta de dinheiro, o parlamento decidiu pura e simplesmente privatizar a democracia.
@Beezz
Carlos Rocha
Rui Mateus no seu livro, Memórias de um PS desconhecido (D. Quixote 1996), descreve extensivamente os mecanismos de financiamento partidário, incluindo o uso de contas em off shore (por exemplo na Compagnie Financière Espírito Santo da Suíça - pags. 276, 277) para onde eram remetidas avultadas entregas em dinheiro vivo. Estamos portanto face a uma cultura de impunidade que se entranhou na nossa vida pública e que o aparelho político não está interessado em extirpar. Pelo contrario. Sub-repticiamente, no meio do Freeport e do BPN, sem debate parlamentar, através de um mero entendimento à porta fechada entre representantes de todos os partidos, o país político deu cobertura legal a estes dinheiros vivos elevados a quantitativos sem precedentes. Face ao clamor público e à coragem do voto contra de António José Seguro do PS, o bloco central de interesses afirma-se agora disposto a rever a legislação que aprovou. É tarde. Com esta lei do financiamento partidário, o parlamento, todo, leiloou o que restava de ética num convite aberto à troca de favores por dinheiro. Em fase pré eleitoral e com falta de dinheiro, o parlamento decidiu pura e simplesmente privatizar a democracia.
@Beezz
Carlos Rocha
2 comentários:
offtopic:
SOS FICHA LIMPA
Amigo, meu blog (caranovanocongresso.blogspot.com) desde sua concepção se dedica a fazer clipping que denuncie políticos corruptos e os corruptores, e a manter viva na memória de todos o cinismo corporativista dos congressistas, que perpetua corruptos denunciados naquelas casas e também as renúncias de parlamentares que assim fogem da impunidade pra permanecer elegíveis.
Nossas leis falham, por não impedir a candidatura dessa gente.
Resta o horror de ver isto continuar acontecendo? Resta a indignação de ver que não existe limite para estes bandidos?
NÃO! Podemos mudar a lei, podermos limpar a política e pra isso temos um projeto popular, respaldado por mais de 1,3 milhões de assinaturas, com o objetivo de barrar a entrada na política, ou impedir a reeleição, dos chamados “Fichas Suja”.
O Projeto de Lei (PL) 518/09 (Ficha Limpa) entregue ao Presidente da Câmara, Sr. Michel Temer, na porta da Câmara dos Deputados no dia 30/09/2009.
Que foi engavetado e lá vai permanecer se não houver participação popular, temos que lutar pra que os excelências o tirem da gaveta e o aprovem.
Temos que mostrar aos deputados o que queremos através de recados (emails) aos parlamentares.
Na “Rede Bravas Gentes Brasileiras” somos (hoje) 146 membros, e temos uma capacidade ainda não testada, de multiplicar nossa ação. Aqueles que ainda não se filiaram estão convidados a se juntar à nossa rede: http://bravagentebrasileira.ning.com). Esta rede foi criada pela nossa colega e amiga Thaís Gomes. A Thais criou também um Twitter >>>> http://twitter.com/bravagenteb pra que possamos nos comunicar com mais velocidade e a qualquer tempo. Através da rede poderemos sincronizar nossos blogs para divulgar e massificar a campanha.
Estudamos e concluímos que seria interessante se pudéssemos sincronizar uma onda de emails e “literalmente entupir a caixa de email dos excelências”. Vamos mostrar que somos capazes de mobilizar um grande número de brasileiros. Vamos provocar um TSUNAMI de emails, porque o PL 518/09 precisa ser aprovado até junho de 2010.
Escolhemos o 1/2/2010, primeiro dia útil de trabalho(?) dos excelências, para o envio da primeira onda. Sem dúvida precisaremos marcar outras datas/ondas, porque contamos com a resistência dos deputados. Com a repercusão conseguiremos mais adesões para as ondas seguintes.
Pra que a gente consiga esta sincronia e adesão vamos precisar da colaboração de todos.
Conto com a confiança e o entusiasmo de todos, acredito que você será um daqueles pilares em quem poderemos nos apoiar pra que a idéia da aprovação do PL 518/09 seja bem sucedida.
Obs.: Em meu blog tenho dicas de como enviar emails aos deputados, inclui tbm um modelo de email pra ser enviado.
Comecei a ler este blog e ainda não parou de me surpreender pela actualidade dos temas expostos.
Parabéns.
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