04 dezembro 2010

WikiLeaks e os claviculários do segredo


Por ser oportuno transcrevo com ligeiras adaptações uma carta por mim enviada ao directos do PÚBLICO que foi publicada em 16 de Janeiro de 2004


Os claviculários do segredo

Há um velho adágio que diz que o segredo é a alma do negócio. Mas ele é também importante em muitos sectores da vida dos povos. Há o segredo profissional, bancário, de justiça, de estado, militar, etc. E em todos estes sectores há os claviculários do segredo, indivíduos credenciados, após juramento (nalguns organismos oficiais), para manusearem informação, documentos e objectos protegidos pelo segredo. Os militares, por exemplo, têm normas rígidas para tratar as matérias com classificação de segurança, não apenas no seu arquivo, como o seu registo e a sua destruição quando desnecessárias. Qualquer rascunho ou esboço é destruído (antigamente por incineração, hoje no «franjinhas»).

Quando ouço falar nas quebras de segredo, recordo a história do assessor do rei X da Prússia, abordado pelo conde de Y que lhe fez uma pergunta indiscreta. Respondeu-lhe que não lhe podia dizer porque era segredo. O conde retrucou: «eu sei guardar segredo», ao que o assessor respondeu: «eu também sei».

O assessor estava certo. Se o indivíduo credenciado para lidar com informação classificada, prevarica fazendo uma confidência a um amigo, não pode esperar que este, que nem é credenciado, não transmita esses dados a outras pessoas. O responsável pela guarda do segredo não pode violá-lo, não pode permitir a fuga. As normas de segurança que o norteiam não permitem dúvidas ou hesitações, são inflexíveis e exigem rigor.

E não se venha agora apontar as flechas contra os jornalistas ou bloguistas. Não se pode açoitar o miúdo da história que gritou «o rei vai nu». Quem age mal é quem lhes faculta o conhecimento de documentos e dados confidenciais. A nossa democracia, embora ainda pouco perfeita, deve muito aos Órgãos da Comunicação Social (CS), pois tem sido estes que despoletaram situações irregulares que originaram os principais processos judiciais dos últimos anos, e que têm conseguido a resolução de problemas graves que apoquentam as populações, os quais sem a sua intervenção continuariam por accionar. Falhas de serviços públicos, de autarquias ou de grandes empresas têm sido objecto de notícias na CS, e posterior resolução.

Procure-se aqueles que, tendo a seu cargo a guarda das matérias classificadas, não foram suficientemente zelosos, e não se acuse repentinamente a CS, não se lhe coloque uma mordaça. Todos (e cada um) estamos sujeitos a críticas. Em Marrocos, apesar do seu regime autoritário, o Rei amnistiou o jornalista Ali Lmrabet, activo crítico do regime. Sem críticas, sem o papel esclarecedor e informativo da CS a democracia estiola e pode dar lugar a autocracias ou ditaduras, com prejuízo para os direitos dos cidadãos que estão mais distantes das regalias do Poder. Há que evitar a ressurreição do «Portugal Amordaçado».

Imagem da Net

2 comentários:

Zé Povinho disse...

O segredo tem que existir em algumas matérias, e há quem o deva manter enquanto necessário. No caso em epígrafe a maior parte das revelações são reveladoras da paranóia que alguns poderes têm quanto ao controlo da situação em todo o lado, mas também veio a lume a hipocrisia das relações internacionais que se traduzem em comentários e definições caricatas.
As mentiras públicas são os casos mais graves e felizmente ficámos a conhecer algumas, para humilhação de alguns aldrabões.
Abraço do Zé

A. João Soares disse...

Caro Zé Povinho,

Muito se pode dizer acerca deste tema. O segredo é a alma do negócio e há muita coisa que só deve vir a público passado algum tempo. Outro aspecto é que na diplomacia (do croquete e do copo) há muitas maneiras de mostrar trabalho com pouco esforço e, daí, as informações sem interesse ou pouco verdadeiras.

No caso da Wikileaks ressalta o desmazelo tido com as informações classificadas ampliado pelo sistema aberto com bases de dados disponíveis para consulta por vários e numerosos serviços e, se num destes, houver um indivíduo pouco escrupuloso ou ávido de recompensa, dá ou vende dados a estranhos.

Esta abertura das bases de dados tem, no entanto a vantagem de tornar os serviços que lhe têm acesso mais eficientes nas acções interactivas e de coordenação. Em tempos em Portugal pensou-se em criar uma única base de dados para todas as polícias, mas houve quem só visse os inconvenientes da fuga de dados. A transparências não pode ser uma verdade indiscutível, sem mácula, nem defeitos.

Certamente, agora, em reacção a isto, o mundo irá para as bases de dados circunscritas a cada serviço o que traz inconveniente para a actuação concertada e coordenada. Cada um puxa a brasa à sua sardinha, com mais custos e menos eficiência para os interesses nacionais.

Tudo tem vantagens e inconvenientes e há que tomar medidas para reduzir os inconvenientes.

Um abraço
João
Do Miradouro

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Atribuído Pela nossa querida amiga e colaboradora deste espaço, a Marcela Isabel Silveira. Em meu nome, e dos nossos colaboradores, OBRIGADO.

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