20 maio 2008

Confissões de um assassino económico - III (última parte )


Continuação...


AMY GOODMAN: Estamos a conversar com John Perkins, autor de Confessions of an Economic Hit Man. Você diz que, por causa de subornos e por outras razões, deixou de escrever este livro durante muito tempo. O que é que quer dizer com isso? Quem tentou suborná-lo ou quem... que subornos é que aceitou?

JOHN PERKINS: Bem, nos anos noventa aceitei um suborno de meio milhão de dólares para não escrever o livro.

AMY GOODMAN: De quem?

JOHN PERKINS: De uma das maiores companhias de construção civil.

AMY GOODMAN: Qual delas?

JOHN PERKINS: Legalmente falando, não era... a Stoner-Webster. Legalmente falando não foi um suborno, foi... um pagamento por eu ser consultor. Foi tudo muito legal. Mas no fundo eu não fazia nada. Era um entendimento, como expliquei nas Confessions of an Economic Hit Man, que estava... para mim estava... estava implícito, quando aceitei este dinheiro como consultor, que eu não teria muito trabalho, mas não podia escrever quaisquer livros sobre o assunto, pois eles tinham conhecimento que eu estava a escrever este livro, a que nessa altura eu chamava 'Conscience of an Economic Hit Man'. E devo dizer-lhe, Amy, que é uma história extraordinária do ponto de vista de ... É quase à James Bond, na verdade. E eu quero dizer...

AMY GOODMAN: Bem, de facto é como se lê o livro.

JOHN PERKINS: Pois, era mesmo, não era? Quando a National Security Agency me contratou, fizeram-me testes num detector de mentiras durante um dia inteiro. Descobriram todos os meus pontos fracos e seduziram-me imediatamente. Utilizaram as drogas mais fortes da nossa cultura, o sexo, o poder e o dinheiro para me dominarem. Eu venho duma família muito antiga de New England, calvinista, mergulhada em valores morais espantosamente fortes. Sabe, eu acho que de uma forma genérica sou uma boa pessoa e penso que a minha história mostra verdadeiramente como este sistema e estas poderosas drogas do sexo, do dinheiro e do poder podem seduzir as pessoas, porque eu fui mesmo seduzido. E se eu não tivesse vivido esta vida de assassino económico, acho que teria passado um mau bocado só de pensar que havia quem fizesse estas coisas. E foi por isso que escrevi este livro, porque o nosso país precisa mesmo de perceber, se as pessoas desta nação percebessem o que é a nossa política internacional, o que é a ajuda internacional, como trabalham as nossas empresas, para onde vai o dinheiro dos nossos impostos, tenho a certeza de que exigiriam uma mudança.

AMY GOODMAN: No seu livro, fala de como ajudou a implementar um esquema secreto para recambiar para a economia americana milhares de milhões de dólares dos petrodólares da Arábia Saudita, e para posteriormente cimentar a estreita relação entre a Casa de Saud e as sucessivas administrações dos Estados Unidos. Explique isto.

JOHN PERKINS: Sim, foi uma época fascinante. Lembro-me bem, você é que devia ser demasiado jovem para se lembrar, mas eu lembro-me bem de como, no princípio dos anos setenta, a OPEP exercia o poder que tinha e cortou o fornecimento de petróleo. Os nossos carros faziam fila nos postos de gasolina. O país estava com medo de se encontrar noutra crise de colapso-depressão tipo 1929; e isto era inaceitável.

Então, eles – o Departamento do Tesouro, contrataram-me a mim e a outros homens de golpe económico. Fomos para a Arábia Saudita. Nós...

AMY GOODMAN: Vocês intitulavam-se mesmo assassinos económicos... e.h.m.'s?

JOHN PERKINS: Sim, era um termo cifrado com que nos tratávamos a nós próprios. Oficialmente, eu era um economista chefe. Tratávamo-nos a nós próprios e.h.m.'s. Era cifrado. Era como se, ninguém ia acreditar em nós se disséssemos isto, não acha? E então, fomos para a Arábia Saudita no princípio dos anos setenta. Sabíamos que a Arábia Saudita era a chave para eliminar a nossa dependência, ou para controlar a situação. E trabalhámos nesse negócio segundo o qual a Casa Real de Saud concordava em enviar a maior parte dos seus petrodólares para os Estados Unidos e investi-los nas acções do governo dos Estados Unidos. O Departamento do Tesouro utilizava os juros destas acções para contratar companhias americanas para a construção de novas cidades na Arábia Saudita, de novas infra-estruturas... o que cumprimos. E a Casa de Saud concordava em manter o preço do petróleo dentro de limites aceitáveis para nós, o que eles têm feito durante todos estes anos, e nós concordávamos em manter a Casa de Saud no poder enquanto eles cumprissem isso, o que cumprimos, e que é uma das principais razões por que entrámos em guerra com o Iraque. E no Iraque tentámos implementar a mesma política que tinha sido tão bem sucedida na Arábia Saudita, mas Saddam Hussein não foi na conversa. Quando os homens de golpe económico falham neste cenário, o passo seguinte são os chacais, como lhes chamamos. Os chacais são pessoas sancionadas pela CIA que chegam e tentam fomentar um golpe ou uma revolução. Se isso não resultar, passam aos assassinatos ou tentam fazê-lo. No caso do Iraque, não conseguiram chegar até Saddam Hussein. Ele tinha... Os guarda costas eram bons demais. Ele tinha duplos. Não conseguiram chegar até ele. Então, quando os homens de golpe económico e os chacais falham, a terceira linha de defesa, a linha de defesa seguinte são os nossos rapazes e raparigas que são enviados para morrer e para matar, que é sem dúvida o que estamos a fazer no Iraque.

AMY GOODMAN: Pode explicar como é que Torrijos morreu?

JOHN PERKINS: Omar Torrijos, o presidente do Panamá. Omar Torrijos tinha assinado o Tratado do Canal com o Carter muito... e, sabe, passou no congresso por apenas um voto. Era uma questão altamente polémica. Mas depois Torrijos seguiu em frente e negociou com o Japão a construção de um canal ao nível do mar. Os japoneses queriam financiar e construir no Panamá um canal ao nível do mar. Torrijos conversou com eles sobre isto, o que muito aborreceu a Corporation Bechtel, cujo presidente era George Schultz e o advogado sénior era Casper Weinberger. Quando Carter foi corrido (e esta é uma história interessante... como é que isso aconteceu na realidade), quando ele perdeu as eleições, e entrou Reagan e Schultz veio da Bechtel para secretário de Estado, e Weinberger veio da Betchel para secretário da Defesa, estavam todos muito irritados com Torrijos... tentaram convencê-lo a renegociar o Tratado do Canal e a não falar com os japoneses. Ele recusou obstinadamente. Era um homem de princípios. Tinha os seus problemas, mas era um homem de princípios. Era um homem extraordinário, Torrijos. E então, morreu numa explosão do avião, que foi provocada por um gravador com explosivos lá dentro, que... eu estava lá. Tinha estado a trabalhar com ele. Eu sabia que nós, os assassinos económicos, havíamos falhado. Eu sabia que os chacais estavam a cercá-lo e, logo a seguir, o avião explodiu com uma bomba dentro de um gravador. Não tenho a menor dúvida que foi com a sanção da CIA e mais... a maior parte dos investigadores da América latina chegaram à mesma conclusão. Claro, nunca se ouviu falar de tal coisa no nosso país.

AMY GOODMAN: Então, onde... quando é que se deu a sua mudança?

JOHN PERKINS: Sempre senti um sentimento de culpa, mas deixei-me seduzir. O poder destas drogas, o sexo, o poder e o dinheiro, era forte demais para mim. E, claro, eu estava a fazer coisas para as quais tinha sido estimulado com pancadinhas nas costas. Eu era economista chefe. Eu estava a fazer coisas de que Robert McNamara gostava e por aí fora.

AMY GOODMAN: Até que ponto era a sua relação de trabalho com o Banco Mundial?

JOHN PERKINS: Muito, muito próxima com o Banco Mundial. O Banco Mundial fornece a maior parte do dinheiro que é utilizado pelos assassinos económicos, ele e o FMI.

Mas, quando houve o atentado de 11 de Setembro, senti um choque. Percebi que tinha que contar a história porque aquilo que aconteceu no 11 de Setembro é o resultado directo do que os assassinos económicos têm vindo a fazer. E a única maneira de nos virmos a sentir outra vez em segurança neste país e de nos virmos a sentir bem connosco próprios é utilizarmos estes sistemas que implementámos para criar uma mudança positiva em todo o mundo. Estou convencido que podemos fazer isso. Acho que é possível dar a volta ao Banco Mundial e a outras instituições para fazerem aquilo a que originalmente se destinavam, ajudar a reconstruir partes devastadas do mundo. Ajudar… ajudar verdadeiramente as pessoas pobres. Há vinte e quatro mil pessoas a morrer de fome todos os dias. Nós podemos alterar isso.

AMY GOODMAN: John Perkins, quero agradecer-lhe imenso por ter estado connosco.


O livro de John Perkins intitula-se Confessions of an Economic Hit Man.


[*] Entrevista a John Perkins realizada em 09/Nov/2004 no programa 'Democracy Now'. Esta entrevista encontra-se em:


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