12 outubro 2008

A crise financeira global tem uma causa social:os baixos salários mundiais


por: Emiliano Brancaccio entrevistado por Waldemar Bolze
O sr. sustenta que a crise financeira não é um fenómeno puramente técnico, mas tem uma causa social. Por que?

O ponto de partida é a fraqueza do movimento trabalhista, a qual tornou possível um mundo de salários baixos. Contudo, este muto é estruturalmente instável, o que estamos agora principiando a experimentar.
Hoje todos os países tentam manter o nível de salário baixo, diminuindo portanto a procura interna, e têm de encontrar mercados externos para os seus próprios produtos. Este mecanismo funcionou durante os últimos dez anos porque os Estados Unidos funcionaram como um "aspirador" para os produtos excedentes de outros países. E não porque os salários dos trabalhadores fossem demasiado altos e sim porque foi acumulada uma enorme dívida privada nos EUA. O sistema levou a trabalhadores a pagarem suas dívidas hipotecárias com novos empréstimos e a pagarem os juros dos empréstimos com novos cartões de crédito.

Poderia uma estrutura de crédito realmente tão frágil manter-se?

Isto não era senão um bomba relógio, a qual explodiu agora.
As consequências são mais uma vez passadas aos trabalhadores e empregados, ao passo que os executivos da Wall Street, que fabricaram estes explosivos, podem até mesmo lucrar com isto. Tome, por exemplo, o plano Paulson. Ele estipula que o governo vai comprar os activos arriscados dos bancos de investimento e em troca colocar dinheiro fresco à sua disposição, deixando a possibilidade de que os bancos, uma vez passada a tempestade, possam recuperar os seus títulos. Se o governo pagar preços bastante altos, os banqueiros podem finalmente embolsar um lindo lucro a expensas do orçamento do Estado.

Qual o impacto óbvio que terá esta crise?

- Dependerá muito da sua duração e profundidade. Por enquanto, o establishment está a seguir uma estratégia que Giuseppe Tomasi di Lampedusa descreveu no seu livro O Leopardo: "Se quisermos que tudo permaneça na mesma, temos de mudar alguma coisa". O plano Paulson é um exemplo desta estratégia, porque consiste numa permuta de cash por dívidas, concebida para intervir o menos possível em termos de propriedade e de controle do capital bancário. O mesmo se aplica às vendas de acções preferenciais ao governo porque este restringe o direito de voto nas assembleias de accionistas.

Será que a ideologia do neoliberalismo fracassou e que os dias do capitalismo estão contados?

-A ideia é divertida, mas seria ingénuo assumir um fim iminente do capitalismo. Não posso ver como tal coisa possa materializar-se. O grande ausente neste colossal estado de emergência é precisamente o movimento trabalhista. Ao invés disso, vejo a possibilidade de uma mudança no poder relativo dos lobbies das finanças para grupos de pressão política e também de lobbies ocidentais e americanos para outros asiáticos.

Podemos então falar do declínio do império americano?

-Apesar da aparência e de todas as altas temporárias e dos acontecimentos a curto prazo, o declínio americano tem-se verificado de há pelo menos um quarto de século. Um sintoma deste declínio é o comportamento a longo prazo do dólar, cujo preço – convertido à divisa de hoje – em 20 anos caiu de 1,50 euro para cerca de 70 centavos de euro. Este declínio assegura desconfiança em relação ao dólar e provavelmente impedirá os EUA de desempenharem novamente o papel de "aspirador" para os produtos excedentes de outros países. Uma vez que não há um poder hegemónico internacional alternativo, há um perigo de que o sistema monetário internacional venha a encontrar-se num beco sem saída. Neste caso, o desenvolvimento desta crise poderia ganhar características realmente negras e imprevisíveis.


A entrevista original em alemão foi publicada em junge Welt , de 09/Outubro/2008. Emiliano Brancaccio, é Professor de economia do trabalho na Universidade de Sannio, membro da Rifondazione Comunista, e conselheiro da maior federação italiana de sindicatos metalúrgicos, a FIOM-CGIL.

2 comentários:

david santos disse...

Uma exposição claramente lógica. Na minha perspectiva. Quanto à queda do capitalismo é impensável pensar-se que ela esteja acontecer. O capitalismo, esta besta, é muito matreiro. Está a preparar algo que muitos de nós ainda não se aperceberam mas, algo de bom não é. Quanto à entrada dele na Ásia, eu também não creio que isso venha acontecer, pelo menos, com facilidade. A Ásia e os seus povos, já não são o que eram. Já conhecem muito bem os métodos do capitalismo. Sabem que ele é falso e mentiroso. Esta tentativa já o capitalismo a procura há muito tempo, mas não tem conseguido e, por isso, se tem limitado a algumas dezenas de países. Porque o capitalismo, como todos sabemos, é mau, mas também muito perigoso. Ele pode parecer estar moribundo ou em estado de coma, mas isto é falso, ele está com uma estratégia bem definida. Está apenas a tentar desenvolve-la e pô-la em prática.
Espero que os pensadores lhe descubram os pensamentos antes de ele levar a dele por diante. Uma coisa é certa: o dinheiro está onde sempre esteve: no poder dele. Agora a forma como ele quer espezinhar mais do que aquilo que tem espezinhado os povos, é que é o grande mistério. Isto é o que nos deve preocupar mais. Porque ele vem aí com matreirices. Aliás, ele está com matreirices. Ele é tão bandido, que nada lhe custa culpar os pobres e aqueles a quem tem espezinhado de algo que mal possamos imaginar. Não é por acaso que muitos dos seus servidores já dizem que a crise tem de ser paga por todos...
Aconselho a todos homens honestos e de boa-fé que pensem no que ele, capitalismo, claro, andará a engendrar. Coisa boa, não é, garanto.

David Santos

Anónimo disse...

Caríssimos amigos,
não podia estar mais de acordo com o David Santos a quem envio um grande abraço.
Caro David, faltava esta opinião. Confesso que estou muito mais descansado. UFA...

«Governo do PS assegura liquidez e dinamiza economia e-mail
13-Out-2008

O Governo vai prestar garantias até 20 mil milhões de euros às operações de financiamento dos bancos em Portugal, para melhorar o acesso à liquidez e, assim, ajudar a economia.

O executivo decidiu "lançar a iniciativa de prestar uma garantia às operações de financiamento que doravante sejam levadas a cabo pelas instituições de crédito em Portugal", disse o ministro das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos, acrescentando que podem ir até 20 mil milhões de euros.

O objectivo desta medida é "reforçar a capacidade do nosso sistema financeiro" para melhorar o acesso à liquidez, dado que "sem financiamento da actividade económica não haverá progresso económico", afirmou o ministro.»
In PS on-lne

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